sexta-feira, 28 de agosto de 2009

"A Bahia passa por uma transição política. Agora somos um Estado Republicano"


Entrevista do ex-presidente estadual do PT e ex-deputado federal, Josias Gomes ao site Bahia on-line do jornalista ilheense Mauricio Maron.





Ex-presidente estadual do Partido dos Trabalhadores e ex-deputado federal, Josias Gomes não tem receio de falar o que pensa, mesmo que para isso não receba a aprovação de determinados setores do seu próprio partido.

Nesta entrevista exclusiva concedida ao Jornal Bahia Online, Josias analisa o governo Wagner, condena a falta de habilidade dos petistas na eleição de Salvador que desencadeou a briga do PMDB com o PT e diz que o partido não está equivocado ao defender o presidente do Senado, José Sarney.

Josias Gomes ainda acusa a imprensa brasileira de armar um complô contra o Partido dos Trabalhadores, criando factóides e denúncias sem procedência. “Veremos este tipo de atitude até a eleição”, revela nesta entrevista concedida ao editor do JBO, Maurício Maron. Uma entrevista imperdível, diga-se de passagem, onde também fala sobre o “Mensalão” e a desfiliação do médico Ruy Carvalho, com quem esperava fazer uma “dobradinha” no sul da Bahia, em 2010.

O que efetivamente diferencia o governo de Jaques Wagner dos seus antecessores?


Posso assegurar que o governo do companheiro Wagner trouxe uma novidade para a política baiana que é a introdução de um conceito, que é imaterial, naturalmente, longe das pessoas, mas que todos sentem. É o conceito de República. Na Bahia, as instituições até certa época, funcionavam como sendo pessoas. Agora estamos consolidando estas instituições, podendo dizer que somos um Estado Republicano. E isso não é uma coisa qualquer. As pessoas têm direito às críticas, aos elogios e às preferências, sem perseguição alguma. Os recursos passam pelas Prefeituras do PT e do DEM sem nenhuma discriminação por que é assim que um governo Republicano tem que atender. Entendemos, inclusive, que ainda há muito a ser feito. Mas se você quiser comparar qualquer número nosso com os dos governos passados nós, sem dúvida, estaremos à frente.

Há setores da sociedade que acham que, analisando o início e o atual momento do governo, se alguém saiu perdendo sob o ponto de vista político foi o sul da Bahia, que começou com três secretários de estado e hoje possui apenas um. Qual sua opinião sobre isso?

Todo governo precisa de acomodação. Se você observar, o critério de quantidade é importante. A região tendo secretários da própria região, o olhar sobre ela é, sem dúvida, muito mais agudo. Porém este não é e nem poderá ser um critério uno. É claro que nós vamos torcer sempre para a nossa região. Mas a Bahia é um estado de uma grandeza extraordinária. Sim, aí você me diz: “e o que eu tenho a ver com outras regiões?”. Posso garantir, no entanto, que as questões que dizem respeito a esta região elas são muito bem tratadas. A despeito de termos apenas um secretário hoje (Edmon Lucas, da Integração Regional), não há nenhuma falta de solução de continuidade às propostas que o governo tem para cá. Na hora que foi preciso, por exemplo, a secretaria estadual de Saúde se deslocar para resolver o problema da dengue em Itabuna, isso foi feito. O secretário passou uma semana em Itabuna. Passou o tempo necessário para que houvesse o socorro.

“Na Bahia, as instituições até certa época, funcionavam como sendo pessoas. Agora estamos consolidando estas instituições, podendo dizer que somos um Estado Republicano. E isso não é uma coisa qualquer.”

O que faltou ao perfil dos políticos regionais que já não estão mais lá?

Preciso dizer uma coisa. O Geraldo (Simões, ex-secretário de Agricultura) teve um desprendimento muito grande ao colocar seu cargo à disposição do governador para que houvesse uma recomposição do governo no momento em que estava sendo iniciada uma crise política com o PMDB, que era o mais importante aliado nosso. Esse fato é que deve ser louvado pela região. De ter políticos que ainda que estejam bem posicionados nos seus status, possam abrir mão de um cargo importante para contribuir com uma recomposição do governo, permitindo que continuássemos ampliando a nossa base para além da base que elegeu o governador Wagner.

Qual sua opinião sobre esta crise do PMDB com o PT na Bahia?

No primeiro momento eu fui um dos que trabalharam enormemente para que tivéssemos a aliança consolidada na eleição de Salvador. Julgava que esta era a decisão acertada. E o governador também pensava assim. Infelizmente o PT de Salvador não aceitou a unidade. Foi ali que começaram os problemas entre nós e o PMDB. O partido foi pra cima, conseguiu eleger João Henrique, elegeu também um bom número de prefeitos pelo interior e, na visão do PMDB, estas circunstâncias o credenciavam a vôos mais altos na relação com o PT. Foi um momento complicadíssimo esse. Nós estamos atravessando uma fase de transição na política baiana. Aquele mandonismo, aquela forma de gerenciar a política perdeu espaço para uma nova forma de se relacionar na política. E é neste momento que todos temos que ter a paciência de entender que naquele momento era fundamental manter a aliança com o PMDB. Eu sou daqueles que entendem que esta aliança seria muito importante. Somos o quarto estado em número de eleitores e a aliança com o PMDB faria um bem enorme às costuras nacionais que vamos ter com o PMDB para sustentar a eleição da companheira Dilma (Roussef) no primeiro turno. É também bom que se diga que o governador, em momentos que antecederam o rompimento, foi daqueles que declararam publicamente que tinha um enorme prazer de continuar com o PMDB na aliança. Mas o ministro Geddel concluiu que havia chegado a hora do rompimento. E isso não foi bom. Nem para o PMDB, nem para nós que estamos atravessando esta transição.

“Geraldo (Simões, ex-secretário de Agricultura) teve um desprendimento muito grande ao colocar seu cargo à disposição do governador para que houvesse uma recomposição do governo no momento em que estava sendo iniciada uma crise política com o PMDB.”


O pior é que a recomposição recebe críticas do próprio PT, partido do governador, que se acha injustiçado enquanto vê adversários históricos ocupando cargos importantes.

As alterações que ocorreram foram no sentido de consolidar um novo bloco político com os partidos que estão aceitando estar conosco. Agora já surgem setores da imprensa que dizem que os partidos não são tão importantes quanto as pessoas. Essa discussão é um negócio que vai e volta. Tem hora que importa mais as pessoas, tem hora que importa mais os partidos. O importante salientar é que o governador Jaques Wagner chamou para si a responsabilidade de recompor a base de sustentação do governo e eu digo que é uma das mais brilhantes tarefas políticas que o governador empreendeu nestes últimos tempos. Claro que o PT, como partido que lidera este caminho, pretende ter um espaço maior neste processo. Mas julgo que é uma discussão que está em curso. Não vejo isso como uma razão para revolta de parte do PT, como você diz. O PT quer ganhar a eleição, conquistar espaços, eleger deputados, das mesma forma que os aliados também. Isso é fato. O importante é que o núcleo político do governo consiga trabalhar as diferenças e produzir um consenso que é o que nos importa para garantir a reeleição do governador Jaques Wagner.

“Estamos atravessando uma fase de transição na política baiana. Aquele mandonismo, aquela forma de gerenciar a política perdeu espaço para uma nova forma de se relacionar.”

O PT não se entende nem internamente. Vai ter disputa interna pela executiva estadual. Tudo o que o governador não queria que acontecesse neste momento.

Felizmente o PT é um partido que tem vida própria. Hoje a principal liderança do partido é o governador. Ele fez um apelo e as principais lideranças das diversas correntes acataram o chamamento para a unidade. Mas a direção do PT às vezes extrapola estes acordos. E, hoje, o que surpreende são algumas candidaturas laterais. Nenhuma dessas chapas alternativas que se colocaram é originária de correntes nacionais. São agrupamentos sub-regionais e algumas delas com características muito regional mesmo. Acho que o mérito está em saber que 95 por cento do PT da Bahia vai estar unido em torno do companheiro Jonas (Paulo, atual presidente). É um momento de muita unidade no PT. E eu te digo: isso é a prova que a maturidade do Partido dos Trabalhadores é fantástica, a despeito de parte da imprensa ainda continuar querendo pregar a desunião, o desacordo. Mas eles têm que encontrar outros argumentos para apresentar a desunião. Por que agora não tem.

“O importante é que o núcleo político do governo consiga trabalhar as diferenças e produzir um consenso que é o que nos importa para garantir a reeleição do governador Jaques Wagner.”

Voltando à crise com o PMDB. Não faltou uma mãozinha do presidente Lula para resolver o problema antes do rompimento?

É difícil para uma questão estadual conduzi-la para o âmbito nacional. Na política há diferenças em vários estados e não apenas na Bahia. Então essa questão não pode ser colocada desta forma: “por que o Lula não agiu mais ou menos”? Ora, se ele tivesse que fazer isso na Bahia, teria que fazer também em outros estados, nas bases dos outros ministros. O acerto do jogo político no estado deve-se a nós próprios.

“É um momento de muita unidade no PT, a despeito de parte da imprensa ainda continuar querendo pregar a desunião, o desacordo. Mas eles têm que encontrar outros argumentos para apresentar a desunião. Por que agora não tem.”

Vamos tocar em um assunto mais regional: a saída do médico Ruy Carvalho do PT de Ilhéus. O que o senhor acha desta decisão?

Lamento. Uma figura histórica, um passado brilhante na política de Ilhéus. Foi uma das pessoas que tivemos a possibilidade de dirigir Ilhéus. Agora, são momentos da vida as pessoas. E as decisões estão aí para ser tomadas. E ele preferiu um outro caminho político. Que tenha sorte na nova escolha.

Falava-se muito numa dobradinha do senhor com ele em 2010. Com a saída dele, como fica a reconstrução deste projeto político no PT de Ilhéus.

Esse debate nós vamos começar a fazer a partir de agora. É claro que nós temos uma base sólida de apoio na cidade de Ilhéus, fruto do trabalho que construí na legislatura passada, quando fui parlamentar. E esse trabalho evoluiu politicamente na medida em que somos hoje um partido em Ilhéus com três vereadores. Aumentamos as votações para presidente da República, para governador e mesmo isso sendo em parte reflexo da militância e do trabalho que vem sendo feito, é também fruto das ações concretas que eu pude executar aqui quando fui deputado federal. Há um trabalho pensado, um conjunto de lideranças locais que continuam nesta mesma trilha e tenho convicção de que nós não deixaremos de ter uma excelente votação em Ilhéus por tudo que as lideranças e o meu trabalho fizeram pela cidade.

“Outras crises vão ser produzidas até as eleições. Não tenha dúvida. Nós do PT vamos ter que ter muitos nervos de aço por que a imprensa não vai deixar de fabricar feitos como este”.

O tempo todo nesta entrevista o senhor fala do comportamento da Imprensa. Aliás, sua queixa com a imprensa vem desde quando o senhor foi denunciado no esquema do Mensalão, fato de grande repercussão nacional...

... O PT tem sido vítima quase que freqüente de ataques da imprensa. E a relevância que se dá a determinados episódios com os quais nós passamos tem sido constante. Aquela crise em 2005, o “Mensalão”, de forma difusa se produziu um impacto na sociedade. E aqui não estou querendo abstrair os erros que cometemos. Mas é a amplificação que se dá à crise, aos problemas. Agora mesmo estamos às voltas com três crises. A da Receita, a imprensa consegue manter por mais de 15 dias uma discussão se uma superintendente da Receita entrou ou não entrou no Palácio, falou ou não falou com a ministra Dilma. Tem a Crise do Mercadante, que tem a ver com a crise do Senado, e a CPI da Petrobrás. Você observe que no caso da Petrobrás, a CPI perdeu o foco, primeiro por que a ação que motivou a CPI, que era a sonegação de imposto, não passou de uma má fé de uma imprensa que não teve a devida responsabilidade com os seus leitores. Ora, o que está por trás disso tudo? É que no ano que vem o PT apresenta-se à sociedade como o governo que mais contribuiu para o sucesso econômico e político da nação. Digo uma coisa: outras crises vão ser produzidas até as eleições. Não tenha dúvida. Nós do PT vamos ter que ter muitos nervos de aço por que a imprensa não vai deixar de fabricar feitos como este.


“Vejo na defesa do PT a Sarney uma tarefa política, não tem nada de antiético do PT ou de quem quer que seja”.


Mas a postura do PT em defesa do presidente do Senado, José Sarney, recebe críticas da sociedade e divide até mesmo o próprio partido...

... Não tem divisão do partido. Agora mesmo você observe a posição do (Ricardo) Berzoini (presidente nacional do PT) em defesa do senador e da posição de que Aloísio Mercadante tinha que se manter como líder da bancada. Não houve uma crítica dos 85 membros do diretório nacional, de nenhum membro do diretório estadual, de nenhum senador e de nenhum deputado. Criticas que digo no sentido de questionar a posição do PT. A fala destoante de um ou de outro isto é parte do processo. A discordância em relação à posição do PT é que não houve. Vejo na defesa do PT a Sarney uma tarefa política, não tem nada de antiético do PT ou de quem quer que seja, por que não é disso que se trata. Nós sabemos bem ao longo dos últimos anos quem dirigiu o senado. E os problemas estão sendo apurados como tivessem surgido agora. Isso não é verdade. A imprensa brasileira sabe muito bem o que se passa no Congresso. E agora vindo à tona com a virulência que a imprensa que fazer não podemos esperar que as coisas aconteçam. A população tem que saber que foi a maioria do PSDB e do DEM que impediu a continuação da CPMF, que tinha uma incidência direta de apoio e atenção aos mais pobres. E quem pagava eram os ricos. Eles cometeram um crime contra os pobres do Brasil. Este grupo está impedindo o desenvolvimento do País e vem com esse discurso de ética. Isso aí a gente topa discutir em qualquer fórum, em qualquer instância, por que não há um partido mais ético, com condições morais no Brasil, do que o Partido dos Trabalhadores.